Newsletter #8: Zonas de Intensidade: O Segredo para Prescrições de Exercício mais Eficazes
Vamos falar sobre intensidade do exercício?
Desde que comecei a estudar sobre exercício, uma das coisas que mais me impressionaram foi como nosso corpo possui pontos de transição fascinantes. Basta um pequeno aumento na intensidade, e a resposta do corpo muda completamente. Por exemplo, realizar um exercício aeróbio 10% acima do primeiro limiar é uma experiência totalmente diferente de fazer o mesmo 10% abaixo. E se estivermos falando de 10% abaixo do segundo limiar, aí a dinâmica muda completamente!
Quem já correu ou treinou para uma maratona sabe bem o valor de estar na zona certa. Agora, para quem trabalha com pacientes com doenças cardiopulmonares graves, exercitar na zona errada pode ser a diferença entre o sucesso e… uma tragédia. Quando você começa a estudar esse assunto com mais profundidade, percebe que esse terreno é muito mais confuso do que parece à primeira vista. E o primeiro desafio já aparece na diferença de nomenclaturas para as zonas de treinamento. Tem autores que dividem os domínios de intensidade em 3, 4, 5 e até 6 zonas!
E não para por aí: os nomes dados às zonas também variam bastante. Os pesquisadores da área de endurance, por exemplo, costumam usar termos como moderado, pesado, severo e extremo. Já os clássicos da fisiologia, o ACSM e a literatura tradicional, preferem os rótulos de leve, moderado e intenso.
E os limiares? Ah, aí é que vira uma bagunça total – uma verdadeira “zona”! Cada autor usa uma nomenclatura diferente, o que acaba deixando o tema mais complicado do que deveria.
Mas calma! Minha missão aqui é descomplicar tudo isso e tornar esse assunto mais fácil de entender. Vamos juntos?
Nessa newsletter vou tentar ser o mais didático possível e vou dividir inicialmente as zonas em 3 e vou usar os limiares como zona para demarcar esses 3 pontos. Dentro das sessões vou diferenciando cada uma e subdividindo de acordo com as mais diferentes abordagens.
Zona 1- Classicamente chamada de "leve", mas também pode ser chamada de "moderada", treinos abaixo do primeiro limiar (ventilatório ou lactato) ou "treinos em Z2"
Essa intensidade corresponde ao exercício realizado abaixo do primeiro limiar, onde a sensação de esforço é baixa (até 3 na escala de 0 a 10 ou em torno de 11 na escala de Borg de 6 a 20). Aqui, predominam as fibras do tipo I, o metabolismo é quase 100% aeróbio, e os ácidos graxos livres (gordura) são o principal substrato energético.
Essa zona é amplamente utilizada em dois extremos do condicionamento físico. No ambiente clínico, é a base das fases iniciais do tratamento, ajudando o paciente a fazer a transição da inatividade para uma vida mais ativa, de forma segura e progressiva. Já no outro extremo, atletas altamente treinados em endurance dedicam cerca de 80% do volume total de treinamento a essa intensidade.
Mas por quê? Porque essa zona é incrivelmente eficiente para:
• Otimizar a capacidade de oxidação de gorduras, algo essencial para exercícios prolongados;
• Aumentar a tolerância a esforços prolongados, sem gerar desgaste excessivo;
• Permitir treinos de longa duração, reduzindo o risco de lesões.
Além disso, essa intensidade promove um deslocamento do primeiro limiar para a direita, aumentando a eficiência metabólica, embora tenha um impacto modesto ou nulo (no caso dos atletas) no ganho de VO2máx. É a base sólida tanto para quem está começando quanto para quem busca desempenho extremo!
Zona 2 – No ambiente clínico, “exercício moderado”; no esporte, “exercício pesado”; a intensidade entre os limiares (Z3 e Z4 nas 5 zonas de FC)
O primeiro limiar (aguarde uma newsletter exclusiva sobre limiares) é o principal marcador da transição do leve para o moderado. Ao ultrapassá-lo, o estresse fisiológico aumenta significativamente.
Nesta intensidade, as fibras do tipo IIa passam a ser mais recrutadas, e a demanda por oxidação de carboidratos cresce para sustentar a contração muscular. Aqui, o metabolismo aeróbio conta com uma suplementação do metabolismo anaeróbio, mas atenção: isso não significa que o exercício se tornou anaeróbio. Se você aprendeu diferente, vale a pena conferir os estudos mais recentes e assistir as aulas do nosso curso sobre o tema.
Prescrever exercícios nessa intensidade traz ganhos mais consistentes no VO2máx e também ajuda no deslocamento dos limiares. Em termos práticos, a frequência cardíaca fica em torno de 70% da máxima, enquanto o consumo de O2 está em torno de 55 a 60% do (mas esses números pode variar muito). Nesta zona, o volume sistólico já atingiu o seu máximo, a atividade vagal praticamente desaparece, e o sistema simpático assume o comando, contribuindo para elevar a FC.
ZONA 3- também chamado severo, acima do 2º limiar ou do ponto de compensação respiratória. Esta zona compreende a Z5 da FC
Aqui estamos falando de exercício de alta intensidade. Nessa zona, são recrutadas as fibras do tipo I, IIa e IIX, com a ressíntese de ATP sendo quase 100% dependente do glicogênio muscular.
A sensação de esforço é elevada, mas, ao contrário do que muitos pensam, pessoas saudáveis conseguem se manter nessa intensidade por 5 a 8 minutos. Além disso, diversos estudos já colocaram cardiopatas para realizar ao menos 4 minutos nessa zona, mostrando que, embora a contribuição anaeróbica seja maior, o predomínio na produção de energia ainda é aeróbio.
Essa zona é extremamente eficiente para:
• Aumentar o VO2máx;• Melhorar a velocidade anaeróbia;
• Ampliar a tolerância a esforços intensos.
Ela é amplamente utilizada tanto no meio clínico quanto no esportivo. Treinos intervalados são essenciais para atletas de endurance e, em periodizações polarizadas, cerca de 20% do volume total é realizado nessa intensidade. No ambiente clínico, também há vários estudos comprovando sua eficácia – e nós temos uma aula completa sobre isso na nossa plataforma!
4- Exercício anaeróbio ou intensidade extrema do exercício.
Nesta intensidade, começam os chamados exercícios anaeróbios, com duração geralmente de até 70 segundos (para alguns autores, até 120 seg). A ressíntese de ATP é predominantemente anaeróbia, ocorrendo por meio da quebra da glicose e do uso de fosfocreatina. Essa zona é utilizada em exercícios como o RST (Repeat Sprint Training) e o SIT (Sprint Interval Training). Um ponto interessante é que, devido à curta duração (menos de 2 minutos), a frequência cardíaca permanece abaixo da máxima, e o fator limitante não é o sistema cardiorrespiratório, mas sim o sistema neuromuscular.
Na reabilitação, exercícios dessa zona são pouco explorados, já que os protocolos mais utilizados envolvem treinos de alta intensidade mais longos (HIIT longos), que são mais eficazes para ganhos de VO2máx.
Como funciona na prática? Se a velocidade correspondente ao seu VO2máx é 14 km/h, nesta zona você deve realizar sprints a 15 ou 16 km/h por alguns segundos, seguidos de um período de repouso suficiente para repetir o estímulo.
Chegando ao final !
Compreender as zonas de intensidade é essencial para qualquer profissional que trabalha com a prescrição clínica do exercício.
Cada zona tem um papel específico no condicionamento físico e na reabilitação, desde o estímulo inicial para pacientes sedentários até o refinamento do desempenho em atletas de elite. Saber como aplicar corretamente essas intensidades não só maximiza os resultados, mas também minimiza os riscos, especialmente no contexto clínico.
Na CentralFlix, temos várias aulas dedicadas a esses temas, desde os conceitos básicos até a aplicação prática nas mais diversas populações. Quer você trabalhe com pacientes ou atletas, entender as zonas de intensidade e os limiares é um passo indispensável para prescrever de forma segura e eficiente.
Se você ainda não domina esse assunto, eu te convido a mergulhar nessa jornada comigo e com o Giu. Afinal, conhecimento é a chave para transformar práticas e alcançar resultados extraordinários!
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Nos vemos na próxima aula (15/01/25) ou na próxima newsletter! 😉Forte abraço,
Chico
Algumas boas referências sobre o assunto:
1. Milani, J. R., Oliveira, F., & Gardenghi, G. (2024). Prescrição da intensidade de exercício na reabilitação cardiovascular: Bridging the gap between best evidence and clinical practice. Revista Brasileira de Reabilitação Cardiovascular.2. Jamnick, N. A., Pettitt, R. W., Granata, C., & Pyne, D. B. (2020). An Examination and Critique of Current Methods to Determine Exercise Intensity. Sports Medicine, 50(10), 1651–1672. https://doi.org/10.1007/s40279-020-01324-63. Poole, D. C., & Gaesser, G. A. (2024). Oxygen uptake slow component: Enigma of the 'excess' oxygen used during heavy and severe exercise. Experimental Physiology, 1–2. https://doi.org/10.1113/EP092326